O falso brilho de Oshi No Ko

Chegou a hora de comentar sobre um dos animes mais populares e comentados de 2023, Oshi no Ko, devido ao fato de ser uma adaptação de um mangá fruto da parceria entre a Mengo Yokoyari, a autora do drama Kuzu no Honkai e o Aka Akasaka, o criador de uma das comédias românticas mais definitivas e incríveis da década passada, Kaguya-sama wa Kokurasetai. Mesmo eu não sendo um grande fã dos trabalhos anteriores da Mengo, eu estava bem animado para ver como seria esta nova empreitada artística de ambos.

Só que toda e qualquer mínima expectativa positiva sobre a série foi completamente destruída durante a sua estreia, que mesmo sendo praticamente um longa metragem, contando com 1 hora e 20 minutos de duração e da enorme comoção criada dentro do nicho devido a sua cena final, se provou um episódio bastante fraco e difícil de engolir. Seja pelo seu tosco senso de humor, personagens desinteressantes, diálogos medíocres e os supostos comentários sociais sobre a indústria do entretenimento serem super básicos e superficiais, como a forma que a Ai foi trabalhada durante o episódio, que acabou sendo um grande desperdício, considerando o que eles poderiam fazer com a alegoria de “Idol perfeita” que ela representava. Isso foi equivalente a um imenso banho de água fria, visto que o padrão de qualidade que você esperaria ver em uma obra como Kaguya não estavam presentes aqui de forma alguma. Mas hey… Quem sabe este arco inicial tenha sido um mero deslize? Talvez o Akasaka e a Mengo estivessem guardando o melhor pro final ou apenas se adaptando a esta nova abordagem e podendo demonstrar o verdadeiro potencial da obra mais pra frente. Afinal, sempre existe espaço para evolução e a esperança é a última que morre. E depois de assistir a temporada completa, por mais que eu admita que houve uma considerável melhora em comparação a estreia, este salto de qualidade não foi tão alto para impedir que a experiência em um geral se tornasse algo bem aquém do esperado.

Mas começando com os pontos positivos, devo dizer que fui surpreendido com o quanto o elenco esteve longe de ser ruim como eu imaginava. A Ruby deixou de ser aquela garota terrivelmente irritante, arrogante e escrota do episódio 1 e mesmo ela ainda tendo uma atitude bem inocente, manhosa e quase infantil, após o time skip ela se torna muito mais humilde e amigável. Isso faz com que você se compre o sonho dela ser uma Idol e se apegue a ela muito mais facilmente. A Kana se revelou como uma grande personagem e disparada a minha favorita de toda a obra, com todo o comportamento arisco, sarcástico e cheio de si sendo nada mais do que uma fachada para esconder a grande leva de traumas e neuroses que ela possui devido a sua carreira de atriz mirim e os fracassos e rejeições por parte de seus fãs, familiares e membros da indústria, que agrega várias nuances e camadas a sua composição que eu adorei. Além da Men-cho ser uma personagem bem divertida que consegue trazer um humor muito mais agradável ao que foi apresentado na estreia e a produção ser bem consistente e até acima da média em aspectos como fotografia e direção de arte que faz com que o anime tenha um visual e estética bem invejável, demonstrando que a staff de fato deu tudo de si para entregar o melhor trabalho possível.

E também o tão comentado episódio 6, que é o melhor episódio de toda a série em todos os setores com uma longa distância. Com o roteiro conseguindo criar uma sólida construção para um efetivo clímax dramático no fim do episódio e também fazendo um comentário bem pertinente e incisivo sobre os linchamentos virtuais, egosearch e o cyberbulling e o dano que isto causa no psicológico das pessoas que são alvo dessas ofensas e a produção utilizando as suas melhores ideias e cenas para criar uma atmosfera genuinamente pesada, sombria e depressiva que ajuda demais na imersão da história sendo contada. Principalmente no momento em que decidem contar a história de vida da Akane através de um Flashback, enquanto todos os diálogos são compostos dos xingamentos dos internautas, mostrando o quão mentirosos e descabido são as afirmações feitas à ela devido a esta situação, que foi uma sacada muito fantástica por parte da direção. Assim como a exata cena final da tentativa de suicídio com o corte abrupto mostrando a expectativa na mente da Akane e a realidade, que também atinge bem forte. Tanto é que se este nível de qualidade tivesse sido estendido para o restante dos episódios, provavelmente teríamos um forte candidato para concorrer dentre os melhores animes do ano. Mas infelizmente, não é isso que acontece e não demora para a série mostrar mais uma vez a sua inconsistência e o enredo começar a ruir.

E o maior culpado neste quesito é o Aqua, que sem dúvidas, é o pior personagem da série até aqui. A sua personalidade fria, apática, indiferente, aborrecida e manipuladora é um completo vácuo de carisma, sem contar que certas atitudes devido a sua imensa obsessão com a Ai demonstra que ele tem uma caráter bastante questionável e uma perspectiva de mundo bem deturpada, mas que a obra nunca parece querer admitir. Para cada cena reprovável há outra que tenta vender a imagem que ele no fundo é um cara empático, bondoso e gente fina, o que acaba não funcionando, pois por mais que o roteiro queira trazer um aspecto mais sombrio pra trama através do psicológico conturbado do Aqua, ele nunca tem coragem de levar isso a fundo e mostrar ele como um personagem de fato detestável ou perigoso de alguma forma.

Somado ao fato das supostas críticas sobre a indústria continuarem tão rasas, irrelevantes e sem substância quanto nunca, com o episódio 6 e parte do episódio 7 sendo a única exceção a regra, visto que o restante geralmente são frases de efeitos fazendo alguma constatação bem óbvia e lugar comum ou algum arco que não possui um grande propósito, vide a parte da adaptação do dorama, que tentam evocar este comentário sobre a forma como a indústria desvaloriza o trabalho original dos autores em prol de dinheiro fácil, mas que acaba se encerrando de uma forma quase condescendente, com a autora ficando feliz por esta adaptação e novamente não parecendo ir a fundo na forma industrializada e quase predatória que eles criam e fazem estas adaptações e as consequências disto tanto para o público, quanto para a equipe de produção ou os autores.

E pior que isto, apenas as subtramas românticas e o triângulo amoroso formado com o Aqua entre a Kana e a Akane, que é muito ruim. Afinal, se a obra falhou em fazer com que eu tivesse o mínimo de interesse ou apego no Aqua, imagine então me convencer que ele é este galã sedutor que faz as garotas se apaixonarem por ele? Sem contar que a cena que o Aqua se sente atraído pela Akane devido ao seu complexo de Édipo no episódio 8 é bem tosca e a Kana se apaixonar por ele, com a obra indicando que o Aqua é o seu ponto de apoio também é uma escolha que só limita e reduz o potencial da personagem ao meu ver. Ainda mais depois do flagra de ver o Aqua beijando a Akane em prol de querer descobrir mais sobre a Ai. Tanto que eu preferia muito mais ver um possível desenvolvimento da amizade e aproximação entre a Kana e a Ruby do que com o Aqua, já que a química entre elas e o trio da B Komachi no geral foi bem bacana, apesar de infelizmente eu achar algo improvável.

E a grande conclusão é que este foi um anime bem frustrante. Claro que existem momentos de inspiração aqui e ali que mostram que a série tinha um potencial para ser algo interessante, mas em um geral, ele ainda continua sendo uma enorme bagunça. Principalmente por parecer que a obra não tem foco o suficiente para decidir os temas que querem trabalhar e nem a coragem de explorar e desenvolver eles de uma forma perspicaz, corajosa ou significativa. O que é irônico, pois apesar das supostas críticas à indústria, a série parece muito preocupada com a sua repercussão ao ponto de recorrer a clichês e recursos para fazer ela se tornar mais palatável para um grande público, e consequentemente, mais comercial. E por mais que eu entenda o seu possível apelo e a razão de ter tantas pessoas gostando dela, em vários momentos, eu só me senti assistindo a uma versão atualizada, mas falha, diluída, medíocre e vazia de Perfect Blue. Então é… Melhor sorte para o Akasaka e a Mengo na próxima empreitada, pois apesar de sua imensa popularidade, esta obra não foi muito do meu agrado, infelizmente.


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