Love Vibes | Review

Como são interessantes os mangás josei, né? Na minha ainda curta experiência na demografia, tenho me sentido muito contente e provocado pelos tipos de dinâmicas que ela explora, como se estivessem colocando gentilmente dedos em minhas feridas. Acho que, principalmente, é sobre nos mover a pensar sobre lugares femininos e, muitas vezes por consequência, masculinos também – e pelo menos por enquanto, ficamos na binaridade.

Por exemplo, em “Love Vibes”, a gente é apresentado a essa personagem chamada Mako. A história foca em seu relacionamento com Shouji, um rapaz que tem namorada, mas a está traindo com Mako. Ela gosta dele e ele parece gostar dela num primeiro momento, mas o que vemos também é que há um incômodo da protagonista em razão de que, nessa dinâmica, ela não é uma prioridade nem está em posição de igualdade com a outra parceira do rapaz. Ela é a margem aqui. E o grande lance é ela lidar com essa balança: gosto dele, mas será que vale me sujeitar a esse tipo de relação, em que não sou prioridade emocional?

Em meio a isso, Mako conhece Mika, uma mulher que se diz interessada tanto por homens quanto mulheres e que claramente não hesita em partir para a “ofensiva”, tecendo diversos elogios à nossa protagonista. De início, há uma tentativa de aproximação, amizade, que vai despertando no decorrer das interações sentimentos em Mako. E isso se choca com o fato de que Shouji subitamente “precisa” abandonar a relação e passa a dar um gelo em Mako.

A personagem Mako está dizendo a Shouji que fingia estar tudo bem em ser um relacionamento extraconjugal, mas na verdade isso a afeta negativamente.
Mako e Shouji.

Eu acho particularmente corajoso e prudente de se explorar esse tipo de situação na arte. Acho que é fácil nos sujeitarmos a coisas que não queremos e as relações românticas são um território propício para isso. Existe a ideia de que precisamos valorizar quando alguém nos aceita, não importa como essa pessoa nos trate, e isso parece particularmente mais complexo e forte quando se trata de mulheres. Dito isso, a premissa do mangá ganha outro significado pra mim, uma vez que nunca vi uma premissa parecida ou que desse o devido destaque a esse tipo de dinâmica. É o famoso triângulo amoroso, que, talvez graças ao elemento da bissexualidade e da relação extraconjugal, traz um sabor diferenciado para essa obra.

Gosto como a história não é tão densa em termos de tom, mas expõe bem as dúvidas da protagonista. Aliás, a história até mesmo expõe os defeitos dela. Em dado momento, quando Mako já está começando a construir algo com Maki, ela recebe ligações de Shouji pedindo para voltar. Ela acaba cedendo ao rapaz novamente ao que este diz que terminou com a namorada só pra ficar com ela. É bem babaca da parte dela, só que o arrependimento vem logo. Correr para essa relação ruim faz parte de correr para um lugar conhecido para ela. E acho que isso é algo que pessoas LGBT já relataram bastante, se formos abraçar o lado de Mika: ser trocado por uma relação hétero, porque aquilo é mais confortável para a outra pessoa, ainda que envolva um grau de desconforto. Heterossexualidade compulsória, talvez.

Porém, como dito, Mako percebe que não é Shouji quem ela quer e, sobretudo, após uma tentativa de estupro dele (que não tem nada de explícito, o cara só toma um chega pra lá antes de qualquer coisa acontecer), ela encerra tudo. O relacionamento entre ela e Mika ganha uma nova chance e tem altos e baixos, com que elas lidam com uma certa imaturidade. No final, temos um tom agridoce que acho interessante: é um tom de “estamos aprendendo, tem uma longa jornada pela frente”. Sem perder de vista, é claro, que elas realmente se gostam e querem tentar algo.

Mako e Maki.

Love Vibes é um josei curtinho com um plot bem bacana e pode ser uma experiência para pensar muitas coisas, muitos lugares. Acho que é uma leitura legal para homens, mulheres, não-binaries enfim, seres humanos que se relacionam. E não é para menos: Erica Sakurazawa, a autora, é contemporânea de Kyouko Okazaki (já falamos aqui de Helter Skelter), outra mangaká que também gosta de explorar essas questões humanas.


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