Hisone to Masotan – Entrevista com diretor chefe Shinji Higuchi

Shinji Higuchi é um antigo amigo de Hideaki Anno e de outros no estúdio Gainax, e participou como artista de storyboard em clássicos projetos como Gunbuster e Nadia – Secret of Blue Water. Ele também esteve presente na produção de vários live actions e tokusatsus, trabalhando nos efeitos especiais da Trilogia Gamera de Shusuke Kaneko nos anos 90. Mas seu maior posto é no recente projeto Shin Godzilla (2016), do qual ele dirigiu para a distribuição internacional. Essa é uma tradução da entrevista do diretor para a ANN.

Seu último projeto é Hisone to Masotan, uma estória sobre pilotas que trabalham juntas de dragões numa base militar no Gifu. Como em Shin Godzilla, Hisone to Masotan tem grande foco na burocracia militar, e é certeza de agrado para os fãs do diretor. Higuchi trabalhou ao lado de Hiroshi Kobayashi no estúdio Bones, e escreveu o roteiro junto da Mari Okada.

Entrevistador: Como foi seu primeiro contato com Hisone to Masotan e o estúdio Bones?

Shinji Higuchi: Bem, originalmente estava previsto para eu trabalhar com a Mari Okada em outro projeto. Nós tivemos que pausar isso, mas nós tínhamos esperança que poderíamos voltar a trabalha juntos outra vez; felizmente nós encontramos dessa vez rapidamente. Enquanto, embora eu pensasse que nós iriamos fazer um filme live action ela disse “por que você não tenta fazer uma animação? ” E pensei, “Bem, eu posso também tentar. ” Eu participei em vários projetos de animes anteriormente, mas muitos como auxiliar de algo. Por exemplo, Evangelion era ideia do Anno. Hideaki Anno, Keiichi hara, Mamoru Hosoda – todos esses caras fizeram trabalhos interessantes. Eu não sentia a necessidade criar meu próprio anime. Se eu mesmo fosse fazer um anime, isto teria que ser sobre algo que eles considerassem interessante, também. Algo que somente eu pudesse criar.

Um dia, Okada me convidou para almoçar com ela, e o presidente do estúdio Bones Masahiko Minami participou também. Ela tentou me apresentar para ele, mas infelizmente para ela, eu já conhecia aquele cara bem – depois de todas as vezes que bebemos juntos. Minami era um antigo colega de classe do Anno, e nós ainda saímos juntos. Eu também havia trabalhado de assistente em inúmeros animes da Bones ao logo dos anos. Mas eu nunca me juntei formalmente ao estúdio ou algo assim. Diferente do estúdio Khara ou Trigger onde eu conhecia todos, eu não conhecia a Bones muito bem, por isso pensei que poderia manter distância profissional.

Bones também era conhecida por focar na produção à mão de animações 2D, mesmo o resto da indústria sendo digitalizada. Isso me fez pensar: “Que tipo de animação pode ser somente conseguida a mão? ” Isto é o mais importante a se pensar sobre qualquer tipo de projeto animado. Como com os live actions onde você tem que pensar sobre qual artistas seria melhor para interpretar um personagem, você precisa pensar sobre que tipo de animação seria melhor para comunicar a sua visão quando você está fazendo um anime.

Eu queria usar visuais que ninguém tivesse visto. Assim, quando Okada me convidou a fazer um anime com ela, comecei a pensar especificamente sobre que tipo de estilo funcionaria melhor. Como eu havia pensado, conclui que seria a arte de Toshinao Aoki. Não seus mangás, mas sim pelas suas pequenas ilustrações e coisas que ele postava na internet. Ele frequentemente via suas exibições por perto, eu ia e ficava impressionado pela arte dele. Eu até mesmo comprei uma camiseta do evento, embora ela não servisse em mim (risos).

Aoki é amigo do amigo meu. Você sabe, ele tinha esse trabalho de desenhar as ilustrações das cartinhas do Pokemon. Eu também trabalhei no jogo de cartas do Pokemon um pouco. Nós tínhamos alguns amigos em comuns no facebook, e ele parecia um cara legal, então pensei que poderia conversar com ele. Foi assim que ficamos amigos. Depois de trocar mensagens com ele por um tempo e encontrar ele pessoalmente, pensei que ele seria alguém com quem poderia trabalhar. Portanto nós conversamos e ele aceitou a ideia.

Aceitando a oferta da Okada e decidindo trabalhar com o Aoki, foram os primeiros passos.

Entrevistador: Quando Okada fez a oferta?

Shinji Higuchi: Shoji Kawamori se juntou em 2014, mas as primeiras conversas sobre o projeto começaram em 2012. Que era quando eu decidi que eu queria fazer isto.

Entrevistador: Como é trabalhar com a Mari Okada?

Shinji Higuchi: Como eu disse antes, nós estávamos ambos torcendo para trabalhar juntos. Eu estava realmente ansioso para trabalhar com ela. Eu sou do tipo falador. Sem consciência, eu sempre estive falando das coisas que eu gostava sobre o trabalho dela. Assim nós trabalhos juntos. Como quando nós rebatíamos ideias um para o outro como numa partida de tênis: “O que acha dessa ideia? ” “Que tal isto sobre isso? ”, tudo que ela escrevia apelava para o meu gosto. Eu perguntei como ela sabia do meu gosto. Ela disse, “Você mesmo que me contou”. Então percebi que ela estava tetando ajustar as preferências dela as minhas.

Isso era muito mais do que esperava dela, mas ela também levava nossas ideias a conclusões lógicas e torcia tudo de um jeito chocante. Estava contente disso.

Entrevistador: Como você dividiu as funções de diretor com o Hiroshi Kobayashi?

Shinji Higuchi: Você pode dizer que eu era Nobita e Kobayashi era Doraemon. Quando você está fazendo uma série de TV, existe um limite do que você pode fazer sozinho, e ainda existem os cronogramas para restringir, também. Então eu falei o que eu queria fazer para o Kobayashi, apesar que eu gostaria de supervisionar as coisas e pedir alguns ajustes aqui ou ali.

Entrevistador: Foi sua ideia acentuar as linhas dos modelos em CG e dos designs dos personagens?

Shinji Higuchi: Não, foi ideia do Kobayashi. Ele queria dar a arte uma estética de bem desenhada a mão.

Entrevistador: Quem decidiu a estética geral da obra?

Shinji Higuchi: Bem, a ideia era capturar o estilo artístico do Aoki. Os designs do Aoki só foram adaptados em animes duas vezes antes Hisone to Masotan, por isso precisávamos esculpir nosso próprio caminho. Kobayashi queria trazer até mais do estilo distinto do Aoki. Ele também queria reduzir a dificuldade para os animadores, então decidiu manter os designs dos personagens o mais simples possível. Mas nós não queríamos ir tão longe ao ponto de trair a visão do Aoki. Ponderar as duas decisões foi difícil, mas recompensador.

Entrevistador: Você desenhou algum dos storyboards?

Shinji Higuchi: Eu somente desenhei storyboards para um episódio. Eu também indiquei as decisões musicais e edições, como o tempo e quando cada parte deveria ser tocada.

Entrevistador: Como você descreveria a sua primeira experiência desenhando storyboards?

Shinji Higuchi: Coloquei a maioria das ideias que queria expressar no roteiro. Quando eu desenhava o storyboards, tornou-se um problema de qual seria a melhor forma para comunicar aquelas ideias para o público. Não, risca isso, eu acho que é mais importante desenhar o storyboards que traga o melhor dos animadores. Eu não sabia o quão bem as minhas ideias passavam por eles, mas eles eram os que traziam isso a vida. Mesmo se um corte fosse complicado de animar, queria que fosse algo que fizesse deles animados em tentar. Eu preferia ser o motivador lá.

O jeito que eu via isso, a estória que queria passar para a audiência estava no roteiro, enquanto os storyboards eram quase como páginas de anotações para a equipe. Por isso é importante que a minha ideia passa por eles.

Entrevistador: Como era a sensação de ter escrito algo assustador como o Kaiju (monstro) de Godzilla e Gamera comparado com a de um dragão bonitinho, o Masotan? Por que você decidiu ir por uma abordagem mais bonitinha desta vez?

Shinji Higuchi: Era a melhor a bordagem para a animação, eu suponho. Eu acho que é melhor você retratar uma criatura assustadora como o Godzillha e Gamera em live-action. Se eu realmente quisesse retratar eles e não pudesse usar live-action, então eu poderia ter terminado fazendo por animes. Mas eu já tinha trabalhado em versões live-action deles. Então decidi em mudar a direção completamente.

Honestamente, Masotan não seria aquele bonitinho se ele fosse um live-action. Ele seria horrendo e não bonitinho! (risos). Eu fiz uso da “liberdade” na animação fazer algo que não poderia estar num live-action.

Todo mundo pensava que eu gostaria de monstros assustadores, por isso Kawamori desenhou alguns dragões bacanas para mim, mas aquilo não era o que eu estava procurando. Então, pedi ao (Shigeto) Koyama que fizesse outros. Nós terminamos com designs bonitinhos no lugar.
Entrevistador: Antes do dragão poder ser pilotado, tinha que engolir o piloto. Por que você escolheu estas regras?

Shinji Higuchi: O design dos dragões tomou muito tempo para finalizar. Cerca de três anos atrás, enquanto tínhamos as ideias, o tópico de “como o piloto entraria do dragão?” surgiu. Como o cockpit funcionaria? De modo geral, o cockpit é onde o piloto manipula a aeronave, mas isso tinha que encaixar esteticamente com o restante.

Enquanto discutíamos o problema, Okada sugeriu, “Por que não fazemos o dragão engolir o piloto? ” Até aquele ponto, eu não tinha certeza do que fazer, mas conforme pensava mais, mais sentido fazia a ideia de engolir. Se o dragão comesse o piloto, iria resolver todos os problemas nos designs. Então basicamente é uma ideia da Okada.

Entrevistador: Você acha que existem algum tipo de simbolismo em engolir o piloto?

Shinji Higuchi: Você vai ver isso se quiser ver. As regras podem inverter a dinâmica escravo e mestre. O dragão pode seguir ordens, mas quando ele come o pilote, eles são quem está no poder. Quando eu era criança, existia um livro ilustrado que eu lia chamado Ariko no Otsukai (A viagem da Ariko). Ariko é um bebe formiga que faz entregas, e em certo ponto, ela é comida por um louva-deus. Sendo um espirito de formiga, Ariko continua gritando “Me deixe sair daqui” de dentro do estomago do louva-deus, mas então o louva-deus com a Ariko ainda dentro do estomago é comido por pássaro. Então, o pássaro do qual engoliu o lova-deus com a Ariko dentro é comido por um gato, e assim continua. É como a cadeia alimentar. Mesmo embora ela continue sendo engolida, ela ainda continua viva. Hisone to Masotan é assim, de certo modo.

Entrevistador: Por que você escolheu colocar a história numa base militar das defesas áreas do Japão? E por que em Gifu em particular?

Shinji Higuchi: Isto era algo que aconteceu comigo quando eu conheci pessoas que trabalhavam na força das defesas áreas para o filme Godzilla. Eles são os mais rigorosos e diretos é por isso que eles têm muitas responsabilidades. Se eles tomaram decisões erradas, pode causar sérios problemas. Pode matar muitas pessoas e perder o controle e deixar cair o avião.

Me ocorreu a ideia de que mesmo com nós tendo a imagem de que os aviões voam livres pelo céu, eles não são nada livres. O plano de voo deve ser feito antes de voar, e muitos têm que trabalhar por trás das cenas. Por isto que muitas pessoas na base na verdade não voam, na realidade fazem todo o tipo de trabalho para assegurar o voo dos outros.

Eu descobri que pessoas assim seriam realmente incomodadas por uma criatura caprichosa como um dragão. Mas porque eles são a força das defesas área, eles são obrigados a seguirem qualquer ordem por seu país. Fora dos tempos de guerra, existem muitas coisas que eles devem fazer, como ajudar pessoas, e todo o tipo de serviço porque elas são servidores do público. Mesmo se lhes forem ditos para fazer algo que eles não querem eles fazem, eles irão à campo. Isso é admirável neles. Okada e eu ficamos falando sobre o quanto interessante seria ver uma estória sobre a força das defesas área tendo que criar e viver com dragões.

Então a próxima pergunta seria “Qual base da força área usar? ” Existem cerca de 20 bases com aviões, e cada base tem seu próprio proposito e poderia mexer com aviões de alguns outros países. Essas bases não podem criar um dragão e não podem sustentar o realismo de uma estória. Mas a base de Gifu era diferente das outras porque eles se concentram em realizar testes de aptidão e fazer manuais para as outras bases mais que qualquer outra coisa. Quando existe algo novo instalado nas aeronaves, as pessoas em Gifu são os primeiros a testarem. Não seria estranho ver diferentes tipos de maquinários por lá. É também a mais antiga base da força área no Japão.

Entrevistador: Ah, não sabia disso.

Shinji Higuchi: Foi mostrado no filme The Wind Rises. Que era no tempo de guerra, embora. Todas as aeronaves na estória eram testadas em Gifu.

Entrevistador: Vocês estão acostumados com animações e tokusatsus (live actions). Qual é a grande diferença entre os dois meios, especialmente em como eles perseguem o “realismo”?

Shinji Higuchi: Hmm… Em ambos eles brigam pelo mesmo motivo, mas eles chegam através de diferentes meios. É como comparar como você escala uma montanha com como nadar no mar. Você não usa os mesmos métodos nos diferentes ambientes.

Eu acho que a diferença entre os dois meios é pequena. Pessoas costumavam dizer que anime e live-action são coisas completamente diferentes, e enquanto eles não exatamente os mesmos atualmente, existem vezes em que é complicado dizer a diferença. Por exemplo, animação detalhada pode comunicar o mesmo tipo de nuances e gestos que um ator num live-action poderia usar. Por outro lado, um ator pode exagerar na sua movimentação para dar mais estilo de anime. Existem muitos atores novos atualmente que são acostumados com anime e podem fazer isso. Anime está ficando melhor em replicar a visão e o sentimento do live-action, e vice-versa.

No passado, pessoas discutiam que era impossível para uma mídia ser como a outra. Mas atualmente, em alguns casos para a minha experiência, é como se quase a animação lutasse mais para manter o realismo do que o live-action. Existem algumas pessoas que são realmente muito especiais por fazer com que a animação pareça o mais detalhado e realista possível. Kobayashi é uma das pessoas, por exemplo.
***