Pokémon Filme 21 – O Poder de Todos (2018) | Review

Sobre
Situado na cidade de Fuura, onde as pessoas vivem e recebem o vento misericordioso do lendário Pokémon Lugia. Quando o “Festival do Vento” anual é realizado na cidade, Ash, pikachu e mais cinco personagens dão início a uma nova aventura.

Análise
Pokémon: O Filme 21 – O Poder de Todos é o mais recente longa da franquia, encapsulando uma nova aventura para o protagonista Ash. Trata-se de um filme Stand Alone, que aparentemente é uma espécie de sequência para o filme 20, onde houve um reboot recontando o começo da história do protagonista de uma maneira bem diferente do que é conhecido na série para TV. Não fica evidente em qual se região Pokémon: O Poder de Todos se passa – apesar de soar como Johto – e o filme nem sequer faz questão de mostrar outros Pokémon do protagonista, senão o próprio Pikachu – isso tudo é para trazer uma experiência individual para o filme. Ou seja, não é necessário acompanhar a série, ou sequer ter visto outros filmes, para experimentar este longa-metragem.

O filme 21, ao contrário de todos os seus antecessores, não tem como ponto central do roteiro o conflito de um Pokémon lendário, não tenta fazer fanservice para os fãs com as mais adoradas criaturas aparecendo, e nem mesmo tenta apelar para o saudosismo criando uma grande comoção e batalha de lendários – como foi, por exemplo, no que é provavelmente o filme mais famoso da saga: Mewtwo Contra-Ataca (1998).

Isso ocorre porque com essa geração Sun & Moon que se iniciou em 2016, Hiroyuki Kato, o produtor da série para TV, passou a ficar encarregado dos filmes da franquia também. E resumindamente, da mesma forma que a série da nova geração S&M é uma repaginada não só visual, mas no storytelling que passa a focar mais nos personagens e suas histórias no que nas batalhas propriamente, a ideia era que os filmes de Pokémon também fossem audaciosos tentando coisas novas todos os anos. O filme 20, por exemplo, Pokemon I Choose You, se passa em um mundo paralelo, esse filme que “recria” a história de Ash, com outra abordagem e com uma modernização dos designs utilizados na liga Indigo, já representava o início da nova filosofia para os filmes da franquia.

Para além de um proposta diferente do habitual em termos narrativos se comparado aos anteriores, o Pokémon 21: The power of us ainda conta com a novidade do estúdio OLM embarcando em parceria com o estúdio Wit (Kabaneri, Ameagari, Shingeki no Kyojin) para a cooperação da produção: Remodelagem no design de personagens junto com as famosas habilidades de make up do estúdio convidado, trabalhando no minimalismo dos personagens, background e Pokémon. O design de personagens de Shizue Kaneko ancalçou um resultado glamuroso que ainda se encaixa no realismo que o filme busca em meio a fantasia daquele mundo. A produção de ponta já muito emaculada da OLM, que sempre impressiona com o excelente uso da computação gráfica junto da animação tradicional 2D para criar sequências únicas, obviamente marca sua presença para impressionar no que há de mais tecnológico e moderno na vanguarda das ferramentas de animação em animes. O estúdio sempre cobiçou pelos avanços na tecnologica das ferramentas digitais para auxiliar seus animadores e suas criações; a geração XY já mostrava o avanço com suas ferramentas de criação de backgrounds digitais que permitia aos animadores focarem nos personagens, em mais camadas de animação e detalhes em cada sequência de batalha – além de aprimorar ainda mais as dinâmicas de câmeras, o storyboard muito criativo que a franquia sempre explorou e os closes famosos nos personagens/pokemon durante a batalha, pratica iniciada pelo lendário Masaaki Iwane.

 Esta é só uma das grandes sequências de ação do filme. Exemplo prático do storyboard e closes do veterano Masaaki Iwane.

A história abrange o desenvolvimento de um amplo grupo de personagens que se conectam durante o festival da cidade em que Ash viaja para conhecer. Festival este que, como sugere a tradição, marca a presença ilustre do lendário Lugia em seu último dia; é uma celebração que ocorre anualmente para agraciar o lendário que muito já fez pela cidade. Ao invés da história se formar a cerca de antigas lenda sobre os lendários e/ou seus conflitos – como ocorre em praticamente todos os outros filmes – a narrativa deste filme gira em torno dos vários personagens e dos vários focos de desenvolvimento inerentes para o trabalho da relação humano-pokémon; – não é a toa que o título original do filme é Minna no Monogatari, algo como “A história do pessoal” em uma tradução livre. Mesmo sendo uma série infantil, com um público-alvo direcionado às crianças e uma narrativa de personagens relativamente previsível, O Poder de Todos não deixa de passar mensagens agradáveis, e em certo ponto importantes dentro de sua perspectiva de mundo, ser divertido e ainda agregar desenvolvimentos inéditos para uma franquia como esta.

Eu assisti a versão dublada do filme, em que nacionalizaram os nomes dos personagens originais do longa, será com estes nomes “abrasileirados” que seguirei para com o restante da análise, não estranhem. A partir daqui aparecerão alguns spoilers, mas não farei questão de contar tudo e entregar o jogo; Vou trabalhar de forma mais descritiva para tentar abordar alguns dos vários personagens que são desenvolvidos no envolvimento mais humano do filme.

O passado da cidade envolve um grande incêndio florestal, com um certo Pokémon raro – que não é da região – envolvido, enquanto no momento que Ash visita a cidade a criatura não passa de uma simples espécie de lenda. O vale e as montanhas, aonde no presente está instalada toda a metrópole, era lar dos Pokémon, e há 50 anos os primeiros humanos chegaram nestas terras virgens para criar a cidade e povoá-la; O egoísmo e a vontade de enriquecer que cercavam estas pessoas resultaram em vários descuidos com as criaturas que habitavam aquela área, e uma das consequências foi um imenso incêndio que devastou grande parte da região montanha e dos Pokémon selvagem que lá viviam; A tal criatura rara, que era uma espécie de líder naquele lugar pela sua poderosa força, acabou guardando para si o sentimento extrema raiva dos humanos enquanto também era um dos poucos sobreviventes. No momento da visita de Ash, esses eventos do passado com os atuais acontecimentos do festival de Lugia são interligados através da aparição e participação do restante do elenco.

Entre os vários focos da narrativa, o filme introduzir logo nas primeiras cenas a garota que servirá para o desenvolvimento como representação da falta de paixão que muitos possuem por não viverem com essas criaturas e nem sequer experimentar conviver ao lado delas. Rita, a garota loira que até então era uma colegial comum, que gostava de maquiagem e outras trivialidades do cotidiano; a personagem funciona como fruto desta representação. Rita parte para capturar um Pokémon que seu irmão, machucado no hospital, pediu em comoção à ela. É a partir disso que a narrativa começa a desenrolar para que ela aprenda a não olhar feio para as criaturas, ganhe paixão pela arte de batalhar e fazer contato com esses monstrinhos de forma ascendente. Não só isso, mas mesmo um desenvolvimento mais pessoal da garota, partindo de um ponto passado, em que ela desistiu de algo que gostava, tenta se desabrochar conforme ela percebe que precisa superar seus abalos e seguir em frente, com a mesma coragem que notou nos Pokémon através de suas novas proximidades.

Outra das abordagens do roteiro é sobre um homem chamado Kalil, que parece ter para lá dos 40 anos, tentando agradar a sobrinha de todas maneiras possíveis a partir de mentiras e invenções. Ele faz a garota acreditar que ele é um incrível treinador que já enfrentou incríveis batalhas e testemunhou todas as lendas em que a cidade está envolvida. O filme, a partir dessa base de personagem, quer passar uma legítima mensagem para as crianças – ou mesmo os adultos que assistiram, por que não? – sobre essa simples questão de não inventar mentiras para tentar ser o que não é. O tio mentiroso, que só queria ser um ponto de referência para a sobrinha, percebe durante o longa que suas estórias só o afundam cada vez mais devido às situações complicadas em que ele acaba se metendo – em certo momento não dá mais para esconder tudo pela bola de neve que se tornou. Ele precisa provar seu valor novamente. A presença de um Sudowoodo – o Pokémon que tem aparência semelhante à uma árvore e que sempre finge ser uma para fugir dos pregadores e inimigos – faz uma análoga simbologia com o tio para esta íntima relação entre humanos e as criaturas existentes nesse mundo: O Pokémon acaba se aproximando dele pelo acaso, e em algum momento Kalil percebe que deve parar de fugir, de mentir, e tentar fazer as coisas da maneira certa para ser merecedor do sorriso e dos elogios da sobrinha. Ele precisa fazer por merecer.

Outra vértice do roteiro é sobre o cientista Tiago, que possui  problemas para se comunicar, mesmo sendo inteligente e precisando fazer a apresentação de uma pesquisa importante. Este é provavelmente outro personagem que tenta se aproximar mais do público infantil, uma forma de mostrar e incentivá-las a se comunicarem direito com as pessoas a fim de um crescimento saudável. Apesar de ser um personagem básico e simples em relação ao que ele tenta superar, também ganha seu espaço de desenvolvimento durante a série, sendo umas das chaves para os grandes acontecimentos da parte final do filme. Ainda assim, não há brilho e tanta constância de sutileza da sua participação, é um dos personagens que menos recebe atenção e soa não muito mais do que genérico.

Fazendo certo contraste com Rita, Cláudia é uma idosa que não gosta de Pokémon e passa representar aqueles que não possuem nenhum tipo de apego ou empatia pelas criaturas deste mundo, é a personificação do rabugento que rejeita tudo aquilo ao seu redor. A velha até mesmo anda pela cidade com luvas para que não seja tocada pelas criaturas que passeiam pela metrópole, ela não gosta que a toquem e sente certa repulsa por eles. Ao menos é o que parece. Cláudia recebe um desenvolvimento até memorável durante a parte final do filme, embora o que sustente a personagem em quase toda primeira metade não seja mais do que algumas piadas. O desenvolvimento da personagem implica diretamente em traumas do seu passado que tentam justificar seu comportamento atual no filme – sem mais spoilers. É perceptível os degraus que ela avança para se aproximar dos Pokémon a partir de seu clímax – pois até então não passavam de momentos mais cômicos em que ela simplesmente estava presente. O seu próprio “mini-arco” em um certo estágio do filme faz questão de esclarecer sua personalidade. O desenrolar da sua melhora como pessoa ocorre quase que naturalmente enquanto ela faz um papel-chave no clímax da aventura. 

Existem ainda outros personagens compromissados e até que passam maiores ou menores mensagens durante o decorrer da narrativa, pois como dito anteriormente, trata-se de uma gama de personagens que são alavancados simultaneamente durante o filme. Porém, o protagonista Ash é quem faz todas essas figuras se encaixarem em um só quebra-cabeças durante a execução do filme. Com sua personalidade já muito conhecida – isso não mudou em relação à série para TV ou aos antigos filmes – de quem quer ser amigo de humanos e Pokémon com a mesma força e paixão, o garoto acaba intervindo e participando da história de praticamente todos personagens relevantes do elenco. Ash enaltece aquilo que o filme deixa claro de forma literal em seu título: A força de todos.

Cada desenvolvimento do filme tem seu próprio segmento, mas também um encaixe no problema principal explorado: os assaltos e transtornos que forçam o festival a ser pausado em seu último dia. O reconciliamento do Pokémon raro, que demonstra raiva plena dos humanos, é papel do protagonista. Isso ocorre com a mesma fórmula já vista de outros filmes, como no próprio Mewtwo Contra-Ataca, com o protagonista mostrando que sua paixão é transcendental; ele realmente não se importa muito em se sacrificar ou de agir como escudo-humano para proteger os amigos e convencer os selvagens de que ele é, diferente daqueles de antigamente, uma pessoa que quer ser amigo dos Pokémon. É o mesmo heroísmo aventureiro enraizado de sempre. Ainda assim, boa parte do destaque do filme 21 se dá pelo amplo desenvolvimento de personagens ligados entre si que protagonizam suas próprias histórias e superações. O Pokémon Lendário tem sim sua presença no filme, mas sua cena não tem mais de 1 minuto de duração. Ele não precisa roubar a cena para tornar toda a execução ainda mais grandiosa pelo que se propõe a ser, sua aparição é apenas a continuação das tradições do festival à sua contemplação e benção. A força de todos é bem estabelecida e os laços que unem humanos e Pokémon fazem o principal papel dessa história. A fala do protagonista Ash, responsável por unir tudo, é dita mais de uma vez durante o filme“Se você não consegue fazer uma coisa sozinha, consegue fazer junto com um Pokémon”. Essa é a mensagem final, e mais importante, que o filme passa depois dodo seu decorrer, segmentando o desfecho final pelo exemplo de cooperação que ocorre em seus eventos.Pokémon: O Poder de Todos não é somente bom se falamos do “padrão filmes de Pokémon”, por arcar com vários personagens paralelamente desenvolvidos, em uma narrativa vinculada uma à outra, mas mesmo para o padrão normal de filmes em anime possui seu papel importante. Claro, trata-se de uma série infantil – ao menos, voltada para este público – e sua execução é a prol do entretenimento, mas é exatamente por isso que ele se torna bom em garantir algo a mais. Mesmo nestas condições, e que elas fiquem bem claras, é um bom filme da franquia, facilmente pode-se dizer que é um dos melhores longas da franquia – com absoluta certeza é o melhor entre os mais recentes -, mesmo não sendo o fanservice habitual de ferozes Pokémon lendários em uma batalha de grandes escalas. Eu recomendo que qualquer um assista esse filme, tendo em mente a proposta de desenvoltura mais infantil e pelo trabalho em entreter. É uma grande produção.