Os erros e acertos da representatividade feminina em Boku no Hero Academia | Guest Post #04

Autora do texto: Mari, do blog Rukh no Teikoku (Twitter | Facebook)

Boku no Hero Academia é um mangá de super-heróis criado por Horikoshi Kouhei que iniciou sua publicação em 2014 na Shounen Jump. Em 2016, a obra recebeu uma adaptação para anime pelo estúdio BONES, conhecido por produzir animações de altíssima qualidade, como a de Fullmetal Alchemist: Brotherhood e Mob Psycho 100. Em 2017, o anime recebeu uma segunda temporada e ontem concluiu o lançamento da terceira. 


Olhando pelos números, Boku no Hero Academia é, sem sombra de dúvidas, a bola da vez: foi o quarto mangá mais vendido de 2017 com 5.852.310 de cópias, perdendo apenas para One PieceShingeki no Kyojin e Kingdom [1]. Segundo dados de julho deste ano, já são mais de 16 milhões de volumes vendidos ao todo no Japão [2]. A obra é de uma popularidade insana tanto no Oriente quanto no Ocidente e, por isso, pensei que seria interessante analisar um quesito específico do mangá: a representatividade feminina.

Um dos pontos positivos de Boku no Hero Academia é sua grande variedade de personagens. Professores, estudantes, heróis ou vilões, todos eles possuem um character design diferenciado. Embora haja mais homens do que mulheres no total, há personagens femininas em todas as categorias. Essa variedade de character designs permite ao Horikoshiexplorar diversos tipos de corpos, o que é interessante principalmente para as personagens femininas, que assim fogem do padrão shounen no qual a maioria é peituda e utilizada para fanservice (vide Fairy Tail). A Momo e a Midnight seriam as exceções à regra, porém eu não me lembro de ter visto o autor desrespeitar nenhuma dessas personagens, por mais que suas vestimentas pudessem ser mais adequadas. Meu maior problema nesse sentido foi o fanservice estúpido com a Mt. Lady (“a pleasure to make your ass-quaintance“).

Falando ainda do elenco de uma forma geral, eu acredito que Horikoshi acerta ao criar personagens com características únicas, que não se resumem a arquétipos. Cada menina tem sua própria maneira de se apresentar, agir e falar; suas personalidades são refletidas na forma que montam suas fantasias de herói ou decoram seus quartos. Elas possuem gostos e objetivos pessoais e é sempre ótimo vê-las interagindo umas com as outras. É uma pena que Horikoshi não dê tanto espaço para as meninas brilharem quanto ele dá aos meninos, mas eu imagino que todas as que possuem papéis relevantes para o desenvolvimento do enredo eventualmente ficarão sob os holofotes. Recentemente, inclusive, a Momo teve sua força reconhecida pelo Todoroki, que disse que se o inimigo quisesse de fato vencê-la, ele teria que ter colocado pelo menos 4 contra 1 para conseguir isso.

Em relação aos interesses amorosos, a essa altura do campeonato já ficou bastante claro que a Uraraka gosta do Deku, porém ela não vive em função dele. Nós não vemos a Uraraka precisando ser salva pelo Deku o tempo todo ou correndo atrás dele como se fosse a própria sombra. Uraraka utiliza seu amor e admiração pelo Deku para crescer como personagem, motivo pelo qual o seu papel na história nunca será resumido a “interesse romântico do protagonista”. As personagens femininas de Boku no Hero Academia querem se tornar heroínas tanto quanto os meninos querem se tornar heróis, e elas são tão competentes quanto para exercer essa tarefa. Além disso, é simplesmente fantástico que o All Might, o grande símbolo da paz e uma peça-chave para a história, tenha tido como mestre uma mulher, e repasse os ensinamentos dela para as gerações futuras. 
Há ainda o “The Big Three”, três estudantes do terceiro ano que estão entre os melhores da U.A., formado por dois meninos e uma menina. Esses estudantes possuem um potencial que supera a maioria dos heróis profissionais: Mirio tem potencial para se tornar o número um, Nejire é capaz de derrotar vilões poderosos sozinha e só a habilidade de Tamaki já ultrapassa a maioria dos heróis profissionais [3].

Sendo assim, eu diria que Horikoshi acerta mais do que erra quando se diz respeito à representatividade feminina. Ele precisa trabalhar alguns pontos (como a questão de screentime e o fanservice que não funciona), mas de maneira geral merece ser parabenizado – aliás, em junho deste ano foi anunciado um novo spin-off da série que será focado nas meninas da Turma 1-A, intitulado “Watashi No Hero Academia” (My Heroine Academia) [4]. A única coisa que eu realmente não consigo engolir em Boku no Hero Academia é a existência do Mineta: ele é um personagem que supostamente deveria servir de alívio cômico, mas que simplesmente não é engraçado porque ele só pensa em assediar as meninas. Ainda que suas ações sejam repreendidas por outros personagens, é extremamente irritante vê-lo como um candidato a herói quando ele não é capaz de sequer respeitar as mulheres com quem convive. Esse tipo de coisa não pode ser tratada como “brincadeirinha”. Além disso, não fica claro nem como ele conseguiu entrar na U.A. com aquele poder inútil. 

Enfim, a obra está longe de ser perfeita, mas eu estou animada para ver até onde o Horikoshi levará essas meninas e meninos que sonham em fazer a diferença em uma sociedade tomada pelo caos gerado devido à perda do grande símbolo da paz, All Might.

REFERÊNCIAS

[1] LOO, Egan.  Top-Selling Manga in Japan by Series: 2017. Disponível em: <https://www.animenewsnetwork.com/news/2017-12-06/top-selling-manga-in-japan-by-series-2017/.124894>. Acesso em: 29 set. 2018.

[2] VALDEZ, Nick. ‘My Hero Academia’ Hits Big New Sales Milestone. Disponível em: <https://comicbook.com/anime/2018/08/07/my-hero-academia-manga-new-sales-milestone-16-million/>. Acesso em: 29 set. 2018.

[3] MY HERO ACADEMIA WIKI. The Big 3. Disponível em: <http://bokunoheroacademia.wikia.com/wiki/The_Big_3>. Acesso em: 29 set. 2018.

[4] RIDGELY, Charlie. ‘My Hero Academia’ Officially Announces New, Female-Centric Spin-off Series. Disponível em: <https://comicbook.com/anime/2018/06/22/my-hero-academia-spin-off-heroine-manga-series/>. Acesso em: 29 set. 2018.

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