A constante evolução de Honzuki No Gekokujou

Já fazia bastante tempo que eu queria falar sobre esta obra, mas infelizmente devido a certos imprevistos, eu nunca acabei fazendo. Então, nada melhor do que aproveitar a terceira temporada para finalmente fazer uma merecida review formal da adaptação da light novel de fantasia Honzuki no Gekokujou, carinhosamente apelidada por alguns como “isekai do livro”. Obra que em um curto espaço de tempo acabou se provando como um dos melhores animes saídos da grande leva dos isekais no final da década passada.

Sua primeira temporada não apenas servia como um sopro de ar fresco ao explorar o lado nenhum pouco divertido de renascer em outro mundo, mostrando como sobreviver estando na parte empobrecida de uma sociedade medieval, privado de todas as mordomias do mundo moderno, seria uma situação bem complicada, mas também se destacando pela sua atenção ímpar a construção e expansão de todo o seu universo. Cada invenção criada pela protagonista na busca incessante de obter um livro tem impacto direto na parte econômica e social deste mundo, além de certos personagens como o Benio e o Lutz serem ótimos acréscimos que fazia a trama se tornar ainda cativante. 

A segunda temporada aprimora ainda mais a fórmula ao adicionar uma camada política ao seu worldbuilding. A igreja é inserida com todo seu sistema de castas, um novo conflito é criado com a Myne tendo que se adaptar dentro de um ambiente bastante hostil que demonstrava uma mudança de tom bastante bem-vinda à obra; a expansão do seu universo ainda é mantida, além da constante inclusão de bons personagens como o Gil, a Delia e principalmente o Ferdinand — este último sendo o meu favorito de toda a série, inclusive. E assim chegamos nesta terceira temporada, que representa um ponto crucial no rumo artístico da obra, pois mesmo sendo a mais curta de todas até o momento, com apenas 10 episódios, prova-se como a mais decisiva, servindo como um verdadeiro divisor de águas no enredo. É como se as duas temporadas anteriores tivessem sido uma constante preparação para o que seria apresentado aqui. Por mais que as características bases que fizeram Honzuki ser o que é ainda estejam presentes, como na cena da fabricação das tintas, ou na discussão com o Ferdinand do impacto que a invenção da prensa teria naquela sociedade, é como se isso agora fosse trabalhado por um viés mais sombrio e perigoso. 

Isso fica bastante claro no episódio de estreia. Mesmo se iniciando de uma forma bem tradicional dentro dos parâmetros de Honzuki, o final nos entrega um cliffhanger introduzindo o clã da tinta e mostrando que eles não estão nem um pouco satisfeitos com o novo livro criado pela Myne. Eles se mostram dispostos a fazer o que for preciso para tirá-la do caminho, e essa situação se estende durante diversos cenários em toda a temporada. O novo conflito estabelecido se torna uma verdadeira luta pela sobrevivência, criando um imenso clima de tensão e perigo, já que além da trama deixar claro que estes confrontos estão se tornando cada vez mais inevitáveis, não é mais como se houvesse um lugar seguro para se estar. Tanto o bairro comercial quanto a catedral representam uma ameaça para a Myne em alguma estância, com um novo obstáculo sempre sendo criado. Isso é ainda mais agravado com a inclusão do Sylvester, uma completa incógnita devido ao seu comportamento imprevisível e as suas nebulosas intenções, o que é intrigante até o final da temporada.

E como consequência, o tom cômico, leve e amistoso da primeira temporada vai se dissipando quase por completo, enquanto a obra aproveita este cenário para seguir por um caminho bem mais interpessoal do que de costume. Myne é constantemente confrontada pela ideia de ter que abandonar a sua família em prol de sua sobrevivência, mesmo com o nascimento de seu irmão. Isso ocorre até mesmo no arco paralelo da Delia, que demonstra um certo desenvolvimento em relação a sua típica postura oportunista, apresentando um lado muito mais humano dela ao se apegar ao Dirk, mas que ganha um desdobramento bem dramático, criando provavelmente o clímax mais urgente de toda obra até aqui devido a sua dependência com o Sumo Sacerdote. 

E por mais que isto não seja necessariamente uma novidade para Honzuki, já que a season finale da segunda temporada apresenta um momento bastante dramático da Myne se lembrando de sua vida anterior e percebendo que nunca mais irá poder retornar para lá, a obra sempre fazia questão de ao menos deixar uma mensagem esperançosa ou otimista em seu final para criar um final mais agridoce. Contudo, o episódio final desta terceira temporada é o exato oposto, já que mesmo que o desfecho tenha sido aquilo que inicialmente é esperado, com os vilões sendo derrotados e a Myne obtendo os recursos para continuar suas criações, o preço a ser pago é ela ter que abrir mão do que é mais importante para ela. Mesmo após tanto esforço. E como resultado, a cena final do último episódio é triste, comovente, amarga, melancólica, mas ainda bela e indubitavelmente o momento mais poderoso entregue pela série até aqui. 

A única grande concessão em relação à série é a produção, que infelizmente permanece bem fraca, mesmo sendo a temporada mais bem produzida até agora. Os episódios iniciais apresentam inconsistências de design, mesmo não sendo tão complexos, e há um imenso uso de quadros estáticos em diversos episódios, mesmo tendo servido como sacrifício para as sakugas nas lutas do quarto e penúltimo episódios. Foi uma sábia escolha por parte da equipe usar os poucos recursos oferecidos a eles nos momentos mais importantes da série. Mas por mais que seja perceptível que existe um cuidado por parte dos envolvidos na adaptação, não muda o fato de que a falta de recursos continua deixando a equipe de mãos atadas, impedindo-os de criarem cenas mais ambiciosas visualmente. 

Ainda assim, isso não tira o brilho de seu enredo. O anime não apenas se mantém muito bem escrito e amarrado como de costume, mas também continua se expandindo tanto em relação ao seu rico universo, quanto aos conflitos. A aura melancólica assumida aqui que mantém a série refrescante, cativante e agradável como nunca. E com isso, só resta torcer para que mais temporadas venham para eu continuar acompanhando os possíveis frutos que podem vir deste novo rumo artístico tomado por ela. Muito bom.


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