Visual Novel: A Experiência

E aí, minha gente. Como estão? Espero que bem! Bom, o consumo da arte é algo muito único por se moldar muito mais por quem consome do que por quem cria, não acham? Tendo experimentado diversas formas de arte diferentes, um tipo de mídia me chamou a atenção. Estamos, claro, falando sobre Visual Novels. Aqui eu não vou parar para explicar o que é a mídia, então caso você não tenha a menor ideia do que é uma Visual Novel, então eu aproveito a oportunidade para deixar esse meu vídeo explicando o formato e sua história. Dito isso, hoje eu quero falar sobre a experiência que as Visual Novels (Ou só VN, para abreviar) não só sob a ótica deste que vos fala, mas também sob uma ótica teórica que pode ser a de qualquer um que esteja lendo isto.

Eu acho que o grande segredo por trás da mídia é a liberdade criativa que ela tem. Você sabe que vai ler um bocado, mas fora isso, absolutamente todo o resto é maleável. É algo que muitas vezes pode ir além da história ou personagens, mas na própria estrutura narrativa, a experiência visual ou a até mesmo a programação da VN em si. Isso torna as possibilidades praticamente infinitas, além de tornar a mídia muito imprevisível. Sempre existirá uma VN que fez algo que você nunca ou quase nunca viu antes em outras mídias ou então uma abordagem diferenciada de um tópico mais comum. Bom, não necessariamente essa obra estará traduzida, uma vez que a grande maioria absoluta das VNs não tem tradução, mas enfim. E vale dizer que não vai ser sempre algo positivo, em uma mídia quase desprovida de regras, sempre terão os dois lados da moeda.

Minha história com a mídia é uma que gosto de revisitar, por ser quase um roteiro pronto, mas o “eu” aqui não é relevante para o conteúdo desse post, então vou direto ao ponto: Sendo ignorante sobre a mídia, quando fui atrás de algo para jogar, acabei… “Escolhendo mal”, digamos assim. O conto de uma guerreira que vai em uma torre sinistra explorar o desaparecimento de pessoas de uma vila próxima, com direito a uma jogabilidade de dungeon crawler, me pareceu interessante, apesar das famosas “bandeiras vermelhas” aqui e ali. No fim, acabei tendo uma experiência desagradável e recorri ajuda aos “universitários” para escolherem minhas próximas experiências. Ali sim, eu pude experimentar um pouco do que a mídia tinha a oferecer, e mesmo que todas as obras que consumi naquela época nem entrem em um top 10 VN meu hoje, elas me marcaram por oferecer coisas que eu ainda não havia visto em outras mídias.

O ponto é: Visual Novel é uma mídia em que suas primeiras experiências provavelmente serão as mais importantes. Experiências ruins podem te afastar da mídia, experiências fantásticas, curiosamente, também podem. Simplesmente porque, por exemplo, em animes você pode consumir algo excelente e posteriormente achar outra obra que te ofereça o mesmo, devido ao formato da mídia. Em VN, dependendo do quão única a obra for, é bem capaz de você não achar mais nenhuma obra que reproduza aquela mesma sensação.

Vale um parágrafo para alertar que existe uma noção muito grande de quem vê de fora de que a mídia é basicamente romance (sistema de escolhas + diferentes rotas) e cenas de sexo, já que são dois elementos muito comuns na mídia. Mas sabendo o que você quer ou o que você não quer, fica bem tranquilo encontrar obras que fujam disso. Afinal, estamos falando de dezenas de milhares de títulos produzidos ao longo de quase meio século.

Isso vai desde “não quero conteúdo 18+” até “não quero obras japonesas”, porque sim, há inúmeras VNs criadas ao redor do mundo prontas para serem consumidas. Vejam, uma das VNs mais populares é Doki Doki Literature Club!, que foi feita no ocidente e mais de duas milhões de pessoas baixaram ela na Steam (é de graça, afinal). Então acredito que há todo tipo de conteúdo para todo tipo de gente (exceto quem não suporta ler, aí realmente fica mais difícil). Evidente que saber inglês facilitaria muito a achar opções de conteúdo, mas dependendo das suas exigências, até em português terá algumas boas opções de VNs.

Com isso, acho que podemos ir para a parte boa: os exemplos! Digo, não há nada mais convincente do que mostrar para as pessoas o porque de algo ser uma boa ideia. Por sinal, mesmo tendo a deixa de usar exemplos fáceis como Clannad e Steins;Gate, por já serem obras muito populares devido a suas boas adaptações, vou evitar esses exemplos. Ah, também ignorarei minha opinião pessoal sobre as obras, afinal, o objetivo não é recomendar obras, mas a mídia em si. Se algum dos exemplos lhe chamar a atenção, vá em frente e pesquise sobre (use o vndb.org para isso) e veja se quer se aventurar! Quando eu comecei a jogar as Visual Novels que primeiro me foram apresentadas, como Kamidori Alchemy Meister, eu conseguia ignorar mais os problemas da obra. Afinal, uma obra de fantasia diferente e com um gameplay bem divertido junto de toda a novidade da mídia me fez manter o senso crítico desligado por um tempo.

Ainda assim, um Battle Royale de princesas onde a vencedora se torna a rainha de um mundo de fantasia, premissa de Princess Waltz, tem uma primeira metade bem elogiável até hoje. A condução narrativa das batalhas, junto da trilha sonora épica, ainda é de arrepiar. O fato de ser basicamente um mahou shoujo é só a cereja do bolo. Um bolo que terminou solado? Sim, mas tá aí a menção.

A última das 3 primeiras VNs que joguei, Coμ – Kuroi Ryuu to Yasashii Oukoku –, contava a história de 5 pessoas completamente aleatórias que são conectadas contra suas vontades e ganham a habilidade de invocar um dragão metálico. Conceitualmente é muito interessante pois ela traz cinco perfis realmente bem diferentes uns do outros, um protagonista com transtorno de estresse pós-traumático e uma fantasia urbana muito bem montada, embora eu tenha achado que a história não foi tão bem executada em algumas partes. No fim, foram experiências marcantes das suas próprias maneiras, sendo diferentes o bastante para me fazer querer explorar mais a mídia. Daí sim, por conta própria e escolhendo o que me parecia interessante sem a inocência de antes.

Algumas obras muito conceituadas na comunidade por seus estilos únicos e histórias marcantes eu (ainda?) não joguei, mas acho que merecem essa menção pelo impacto que causaram nas pessoas. No caso, falo de obras como Umineko no Naku Koro ni, The House in Fata Morgana, Muv-Luv ou Subarashiki Hibi. Aliás, quando olhamos as obras mais conceituadas na comunidade ocidental, é notável que a variedade é bem grande, então é jogo ficar atento a isso. No meu caso, várias das obras mais elogiadas passam direto por mim pois não é meu tipo de obra, mas a variedade é sempre bem-vinda.

A gente vê que, por exemplo, se Death Note já foi o sucesso que foi, é razoável imaginar que G-Senjou no Maou também fosse ser um anime muito memorável (se bem adaptado, óbvio). A obra traz não só um ótimo mistério e esses embates intelectuais, mas também a maior parte da sua trilha sonora é composta por adaptações de músicas clássicas, o que faz toda a experiência ser realmente marcante. Ainda no ramo de mistério, Kara no Shoujo foi horripilante. Naquela linha de assassinatos bizarros, horror corporal e tudo mais, não é o tipo de obra que eu normalmente consumiria. No entanto, a obra tem um mistério muito bem executado, com um toque de filosofia por trás e um cenário que dá um diferencial (Japão nos anos 50) no contexto da obra.  

Minha segunda Visual Novel favorita de todas, SeaBed, também é impecável na execução do mistério por trás da obra, certamente uma das experiências mais únicas que tive, mas aqui eu recomendo fortemente jogarem a VN sem conhecimento prévio.

É meio louco como você pode esbarrar em uma Visual Novel que decidiu “pensar fora da casinha” e explorar a liberdade estrutural da mídia a qualquer momento. Em Axanael, por exemplo, a premissa é a de que existe uma arma que funciona como uma roleta russa — aperte o gatilho apontando na sua direção e seu desejo se tornará realidade, porém, uma das balas é real — e, ao menos na primeira vez que você joga, eles levam isso ao pé da letra. No caso, se o personagem vai ter o desejo realizado ou levar um tiro na cabeça é totalmente na sorte. Ou seja, é realmente imprevisível o caminho que o roteiro vai tomar, pois qualquer um dos protagonistas pode morrer.

Em Corpse Party, história sobre um grupo de estudantes que são teletransportados para uma escola amaldiçoada após realizarem um ritual, por outro lado, você até tem controle sobre as escolhas do jogo, mas se um dos personagens principais morrer, muitas vezes a história simplesmente segue sem ele(a). Graças a isso, o jogo tem uma série de finais diferentes para explorar em cada capítulo do jogo.

Às vezes os criadores podem decidir que, ao invés do típico personagem de anime na sua obra, ele prefere que sejam pessoas reais ali, como é o caso de 428 ~Fuusa Sareta Shibuya de~, uma obra no melhor estilo narrativo de Durarara!!, só que com atores contratados para serem os personagens da Visual Novel (OBS: Dessa Visual Novel se originou o anime Canaan, adaptado de um capítulo bônus da VN). No mais, citaria também algumas obras da Liar-Soft, como Forest, por usarem muito do surrealismo e aproveitarem temáticas como conto de fadas para criar narrativas bizarras e propositalmente confusas, usando a metalinguagem e um estilo de arte muito exótico para enriquecer a narrativa e a história.

Eu gostaria de acrescentar que, embora ao longo desse texto eu tenha comentado muito sobre o tanto de Visual Novels únicas, de uma forma ou de outra, que existem, isso não significa que as histórias, artes e estruturas mais comuns não consigam se destacar também. É como eu gosto de dizer, no fim das contas, o que realmente importa é a execução de ideias. Koiken Otome é uma VN que eu gosto muito, mesmo seguindo ali a linhagem das obras de escola de magia que muitos desgostam, é uma obra que trás uma abordagem convincente, em partes até sociológica, e um bom desenvolvimento de personagens.

Também é o caso de Da Capo III, que constrói toda uma trama um pouco mais complexa ao longo das suas 70 horas de leitura, mas sem nunca sair da sua esfera de romance escolar, o que por si só já é um jeito diferenciado de fazer uma obra de romance. A simplicidade não é um problema, o problema seria separar o joio do trigo.

Para finalizar, há também algumas obras que não necessariamente são destacáveis por aspectos únicos, mas que sabem ser diferentes dentro de um estilo artístico mais padrão. Posso citar Enigma:, cuja premissa já te deixa rendido colocando um protagonista com os dias de vida contados por conta de uma doença sem cura, mas que termina indo para uma ilha onde coisas misteriosas acontecem.

Já em Highway Blossoms, é uma simples história de duas mulheres viajando pela estrada em busca de um suposto tesouro perdido que foi descoberto através de um diário antigo. Eu poderia até citar também A Light in the Dark, que conta a história de um rapaz rico que foi sequestrado por uma mulher, tendo toda a trama se passando dentro do cativeiro. Essas citações não são à toa, Enigma: é uma Visual Novel japonesa, Highway Blossoms é ocidental e A Light in the Dark, ou Yeguang, é uma VN chinesa. Pois afinal, boas histórias podem ser escritas por pessoas de qualquer lugar do mundo e Visual Novel é uma mídia que dá espaço para isso. É um universo à parte!

Enfim, citei mais de 20 Visual Novels ao longo desse post, e cada uma delas sem dúvidas poderiam render um post inteiro com a experiência que elas têm a oferecer. Eu poderia fazer um texto 5x maior só citando mais e mais obras, ou me alongando nas que eu já citei, mas o meu entusiasmo com a mídia não precisa ser o seu ponto de partida com a mesma. Eu busquei variar bastante nas citações desse texto para mostrar que vale a pena dar uma chance para a mídia. De fato, acabou que eu não falei muito sobre Visual Novels de comédia que pode ser uma alternativa muito viável para quem não é habituado a ler, mas humor também é algo um bocado mais relativo e até por isso acabei não citando nenhuma obra com foco no gênero.

No dia em que escrevo esse texto, já estou há algum tempo “de férias” de VNs, mas eu sei que quando eu voltar, terei obras diferenciadas para consumir que vão fazer valer o tempo que a mídia exige, mesmo que a obra em si não seja incrível nem nada do tipo. Tomando cuidado para não entrar em nenhum ninho infernal acidentalmente, tem muita coisa para se explorar. Acima de tudo, das obras únicas que te fazem salivar por aquele conteúdo novo até as obras que reutilizam premissas bem comuns em obras japonesas, eu pessoalmente acredito que a liberdade que as Visual Novels têm, dá espaço para elas explorarem seu conteúdo da forma que quiserem, no tempo que quiserem. Artisticamente falando, isso é algo vital para a execução de uma ideia.

Não significa que sempre vai sair bom, até porque depende da qualidade do escritor e do resto da equipe, mas ao menos aqui temos a oportunidade de ver as obras em uma forma menos comercial, por assim dizer. É como comparar jogos AAA com jogos indie, exceto que até as “VNs AAA” tem alguma margem para trabalhar com o impopular, além de terem o tempo para serem desenvolvidas e lançadas na sua forma final.

Acredito que era isso que eu tinha para compartilhar. Visual Novel sem dúvidas é um tópico em que eu poderia focar em diferentes pontos por muito tempo, o tipo de experiência que a mídia oferece é um deles, como puderam ler até aqui. Ainda assim, acho que eu poderia falar muito mais, só não o faço para não ficar mais cansativo haha. Em todo caso, comentem aí quem já jogou alguma Visual Novel ou tem interesse, que tipo de obra você gostaria de ver? Façam como o Ayumu e a Yumina, em Yumina The Ethereal, e entremos no clube de debate! (Eles foram coagidos a isso, mas… detalhes, né?!)


Agradecimento especial aos apoiadores:

Victor Yano

Apolo Dionísio

Essas pessoas viabilizam o projeto do site e podcast HGS Anime. Se você gosta do que escrevemos e publicamos, e gostaria que continuássemos mantendo esses projetos, por favor considere nos apoiar na nossa campanha PicPay, nossa campanha Apoia.seou doando um PIX para hgsanime@gmail.com.