Sayonara, Zetsubou Sensei | O Desespero à Sociedade

Sayonara, Zetsubou Sensei é uma mistura de humor com uma singularidade a mais que o estúdio Shaft o concedeu, tornando o show ainda mais único do que seu próprio mangá – a obra original.
Comecei a escrever este texto com a ideia inicial de ser uma análise sobre a obra, mas com tanto o que falar e pouco espaço em um único post para tal, decidir apenas citar alguns pensamentos mais frescos que tive da série após finaliza-lá. O texto começa mais introdutório a série, porém a partir de um momento contém spoilers sobre como o anime é retratado (haverá um aviso), já aviso que o texto também não possui uma ordem muito lógica de começo, meio e fim; São apenas vários pontos retratados que comentei de forma na qual veio à cabeça.
Conceito
O personagem central é o professor Nozomu Itoshiki (糸色 望), cujo nome lido com vogais separadamente, igual no alfabeto ocidental, pode-se obter a pronuncia “Zetsubou”, que significa desespero; O próprio número de traços que ele precisa para escrever seu nome são símbolo de mau agouro numerológico na tradição japonesa

O trocadilho com o nome do protagonista está diretamente ligado diretamente a sua personalidade: O professor de temperamento depressivo é super pessimista e pensa em se matar por qualquer motivo, este ponto mostra o outro lado da moeda em que o tema do anime se conduz; Fazer críticas à sociedade, da maneira menos virtuosa o possível – com um humor crítico-social.
Além das visíveis críticas, a série também faz sátira ao harém, aquele gênero em que o protagonista, homem, fica cercado de várias garotas durante o show. Em Sayonara Zetsubou Sensei não há nenhum tipo de relação entre o professor e suas diversas alunas que compõem o elenco. Estas que possuem características e personalidades marcantes, pode-se dizer que cada uma é provida de distúrbios mentais diferentes, a fim de que todas contribuam para os eventos malucos e satíricos que acontecem durante a obra.
Não costumo falar tão especificamente sobre cada personagem nas minhas análises pois acaba soando mais como apresentação do que como uma análise propriamente dita, mas como esta é diferente do habitual, citarei um pouco sobre algumas desse elenco tão perturbado. A primeira personagem a aparecer depois do Sensei, logo no prólogo do primeiro episódio, é Fuura. Otimista, alegre e sorridente, a garota é totalmente o oposto do que Nozomu impõe-se sobre sua personalidade. Entre as personalidades da sala do Professor Desespero, ela é a única que é positiva o tempo todo. Kiri é a Hikkikomori esclusa da turma, isto é, está sempre com um cobertor sobre seu corpo e fica trancada em seu quarto, ou em um aposento da escola. Matoi é a stalker propriamente dita do elenco, é a garota que não sabe lidar com seus namorados e por isso os persegue de todas formas possíveis e impossíveis de se imaginar na trama. Maria é uma jovem garotinha que veio aparentemente refugiada ao Japão, e é fácil perceber os abusos pedófilos que a personagem constantemente sofre por homens pela sua personalidade bem doce e jovem, este ponto também é um dos apontamentos que a obra faz, usando a garota como símbolo. 
A última que citarei é Kaere, uma loira “estrangeira” que entra no elenco durante a primeira temporada, possuindo uma bipolaridade entre sua personalidade estrangeira que detesta o Japão, e uma nacional que ama seu país. A partir de sua introdução ao elenco, inicia-se na série as varias sátiras ao Hentai e ao Fanservice, uma vez que muitas das aparições da garota acabam sendo de teor apelativo, irônico e zombeteiro; A personagem frequentemente mostra a calcinha e encontra uma razão em tudo para dizer que vai “processar” alguém. Também existem outras personagens no elenco, como a garota que ama a cauda de animais, a que só sabe conversar por mensagens de texto do celular, uma que é “apenas normal”, entre outras.  Coube a mim resumir sobre as que de certa forma mais me chamaram mais atenção pela bizarrice que criavam nos acontecimentos de que participavam; Além de que todas essas personalidades representavam algum tipo de posição ao tema que eram implicados.
Os episódios acompanham o cotidiano desses personagens em situações mais malucas o possível; Primeiramente começando pelo problema pessoal de cada aluna do elenco que acaba desenvolvendo introduções as mesmas, enquanto críticas ao tema proposto por suas personalidades são tratadas (por isto elas omitiam algum tipo de posição ao assunto, mesmo que de forma debochada), os vários problemas e absurdos demonstrados no anime são fáceis e frequentemente encontrados na sociedade. A série episódica segue de duas a três partes partes a episódio, com acontecimentos diferentes e hilariantes em que de alguma forma “tudo dá errado” e o professor Desespero reclama da sociedade e de qualquer outro ponto que esteja disponível à sua repreensão; Também acontecem eventos “a parte” em que os personagens interpretam outros papéis, como se fossem sub-histórias, outros personagens, mesmo que não faça tanto sentido. 
Enquanto isso, várias referências a outras histórias, animes e pessoas conhecidas vão acontecendo; A maior parte é sobre costumes e trocadilhos em japonês que acabam não fazendo sentido nas traduções disponíveis pela internet, isso devido a demanda complexa de linguagem que acaba se perdendo no processo; O nome do professor como já observado no início e o nome de todos outros personagens que aparecem ao decorrer do show também carregam consigo algum trocadilho. 
Dada a devida introdução, vamos falar dos tantos pontos curiosos e angustiantes que a série nos faz refletir – e quase obrigatoriamente a pensar – em seu decorrer, o que é verdadeiramente impossível falar sobre tudo em um único post. Vários assuntos minuciosos dos episódios de todas as três temporadas do anime mereciam análises separadas e com abordamentos mais complexos, então a partir de agora estarei comentando apenas alguns pontos específicos que a obra aborda, estes que chamaram à beça a minha atenção. 
**A partir daqui spoilers sobre alguns pontos do anime serão citados, mas relevante sobre os desfechos da história. Mais ao final há comentários sobre a parte técnica, juntamente de uma conclusão.
Zetsuboushita!
Nozomu Sensei sempre diz a palavra acima que significa “Estou desesperado!” quando se vê em situações incomodas de negativismo, que logo em seguida o faze reclamar sobre como a sociedade é. 
A primeira e mais óbvia de todas é a crítica sobre as pessoas que recorrentemente querem cometer suicídio por pouca coisa, por razões supérfluas e tolas. O sensei serve como exemplo no anime inteiro, desde o primeiro episódio em que tenta se enfocar em uma árvore (e ironicamente Fuura acha que ele está tentando uma técnica para ficar mais alto, ela é muito feliz e não consegue entender o pessimismo de seu professor). O mais interessante é que as críticas e tabus ditos no anime são exemplificados – e muitas vezes postos a prova – da maneira mais hilariante, absurda e exagerada possível, mesmo que todos tenhamos a consciência que há fundamentos para o levantamento dessas questões.
Os pontos tocados vão desde à cultura em massa, dita japonesa (existem várias outros apontamentos que servem para várias sociedades, inclusive a brasileira), em que as pessoas colocam qualquer coisa em um pedestal para começam a louvá-lo sem entender o motivo, como discussões sobre a sociedade criticar tudo a sua volta, como se fosse uma insatisfação pessoal naquilo que não necessariamente é ruim.
“Estou desesperado!! Com está sociedade feita por números”.
Existem reflexões políticas e sociais também, o professor Desespero fala até sobre manifestações, suas razões e relevâncias, e chega até mesmo a falar sobre socialismo e comunismo (quando também ironicamente é acusado de ser um esquerdista pela sua aluna), com referências diretas – como praticamente todas as outras que faz –, a Che Guevara e até outros nomes. 
Em algumas cenas o anime passa a visão dos japoneses, de como a China os enxerga na relação política entre os dois países.
Se não bastasse singularidade o bastante para o anime, sua adaptação foi feita pela Shaft com o ilustre e memorável diretor Akiyuki Shinbo sobre o comando da série, usando suas técnicas mais conhecidas e inauditas – originais – possíveis na série (como o japonês careca, de óculos e bigode que constante e aleatoriamente, aparece com apenas o seu rosto flutuante em quase todos episódios) que ganhou personalidade própria, com várias e várias partes originais que retratavam e abordavam o próprio anime e os telespectadores, quebrando a famosa quarta barreira.
O anime conversa com ele mesmo. Uma das ferramentas mais utilizadas pelo Shinbo é a passagem de mensagens diretas para os telespectadores do anime através dos episódios, principalmente na lousa da sala de aula que cada vez que aparecia trazia junto várias mensagens e trocadilhos além de piadas internas dos diretores e produtores, todas espalhadas; Mesmo que fosse apenas alguns segundos até que a lousa aparecesse novamente, todas mensagens mudavam. As cenas de transições entre as partes do episódio, que eram feitas mostrando com vários símbolos bem rapidamente na tela, também tinham comentários pessoais, e as vezes aleatório dos produtores; Houveram várias ocorrências de agradecimento pelo sucesso da série, vendas de BD/DVD do anime, e até falando sobre as chances de uma nova temporada.
Algumas das várias notas que o Shinbou coloca no anime, dessa vez um “desabafo”.
Algumas dessas mensagens foram adicionadas bem pouco antes do anime ser transmitido, e isso é facilmente notado com as mensagens dizendo o quanto o primeiro volume do BD/DVD da primeira temporada foi vendido por exemplo, esses dados foram divulgados pouco tempo antes da transmissão da segunda. Em outros momentos e até mesmo em um especial de um pouco mais de um minuto, eles animam um jornal televisivo que pega cartas que os fãs – de verdade – mandaram para a staff do anime, e por meio dessa brincadeira os personagens que apresentam o jornal respondem as cartilhas pelas respostas dos produtores em questão. 
Em um certo episódio da segunda temporada, a preocupação do Sensei é sobre as mídias que fazem continuações; Animes por exemplo, que impedem novas pessoas de acompanharem o que está saindo atualmente por já não ser a primeira temporada; Com isso em mente, o elenco gera a brilhante ideia de fazer do resto daquele episódio uma introdução, para que novos telespectadores que não conhecem a história e nem os personagens possam apreciar melhor. O resultado disso são várias cenas engraçadas dos próprios “fãs novatos” em 2D aparecendo no anime, enquanto na tela ao redor aparece informações sobre o elenco, juntamente com explicações de algumas das técnicas requentadas que Shinbo usa durante a execução. É mais fácil entender com exemplos:
O anime brinca tanto com elementos originais, que até o velho careca que já citei antes acaba aparecendo “definitivamente” como personagem 2D na terceira temporada. Provavelmente muitos se perguntam quem ele é; Pois bem, vou explicar.
Kosaku Maeda, conhecido no anime pelo apelido de MAEDAX, foi o assistente do autor do mangá de Sayonara Zetsubou Sensei. No anime ele ajudou com as dublagens – e certos ruídos, ao mesmo tempo que se fez presente em momentos aleatórios com sua cabeça flutuante. Em algumas partes a direção pega imagens recortadas em 3D dele mesmo e coloca no cenário 2D, fazendo uma interação hilária – e ao mesmo tempo bem bizarra  – entre os personagens; Esse contato também acontece em outras ocasiões, com outros objetos 3D sendo colocados em cena.
Produção
A parte técnica do anime é super excêntrica, mas não menos coerente com sua proposta. Não podemos chamar de “orçamento baixo” a falta de cortes de animação realmente fluidos e outros aspectos que faltam, pois Sayonara Zetsubou Sensei aborda várias temáticas diferentes que rompem com o conceito tradicional de animação 2D. O uso constante de recortes se mexendo é facilmente notável no anime, além de mosaicos que encobrem os personagens a todo momentos e as alterações de cenas já explicadas na imagens anteriores.
Há episódios em que a produção do anime foi mais audaciosa mudando o estilo da própria animação em seu decorrer, fazendo desde Slow Motion até o mais abstrato dos rabiscos. A direção já foi explicada, e o roteiro propriamente brinca entre adaptar o mangá original e fazer seu próprio show singular; 
A trilha sonora tem mérito em passar a intonação certa em todos os momentos de angústia do Sensei, em que a música pode passar de suave a mais melancólica pelos recorrentes desesperos do personagem.
Por fim, os diferentes visuais que as aberturas possuem; Todas são cantadas por Kenji Ohtsuki (talvez o conheçam pela abertura de Ryukendo, Ushio to Tora, etc), com participações especiais de vozes femininas – algumas vezes do próprio elenco. O número de mensagens e simbologias mostradas é enorme, até mesmo o próprio MAEDAX e Shinbo aparecem durante alguns momentos em um dos temas. Seria inviável postar tanto print aqui sobre tudo de importante ou interessante que as aberturas abordam, então apenas assistam-os. (** Embora também sejam bem diferentes visualmente, não vou me estender aos encerramentos). 


Uma história diferente

Sayonara Zetsubou Sensei é, sem dúvida nenhuma ,uma das obras mais diferenciadas dentre as séries de TV já lançadas no Japão. Seu conteúdo é tão absurdo – e as vezes propositalmente exagerado – que mesmo sendo apenas mais um produto da indústria tentando seu lugar à venda, transmite audaciosos confrontos internos e externos contra a sociedade e alguns de seus tabus. É um anime que recomendo para quem tem senso de humor aguçado, paciência e não liga de ver uma série episódica que mostra muita coisa nas suas entrelinhas.