Sekaisuru Kado (2017) – O Ápice da Decepção | Review

Sinopse

Koujiro Shindo é um negociador bastante habilidoso, que trabalha no Ministério de Relações Exteriores. Quando seu avião se prepara para decolar do aeroporto de Haneda, um misterioso e enorme cubo aparece no céu. E com isso um estranho ser chamado Yaha-kui zaShunina aparece de dentro desse cubo conhecido como Kado, dizendo que deseja entrar em contato com a humanidade e apresentar um conhecimento jamais visto. 

Análise

Kado é aquele tipo de anime que apenas com a sua premissa consegue fomentar muito a imaginação do publico em geral, sendo uma obra muita comparada com The Arrival para os mais cinéfilos – tendo muitos elementos em comum, mas os desenvolvendo de forma bem diferentes. Enquanto um se foca em trabalhar personagens e apresentar um drama em torno deles, Kado tem como base o desenvolvimento da narrativa, usando seus personagens apenas como elementos para movimentar a estória. Aliando esse certo “hype” em torno do anime, com um começo muito bem orientado e construído, a expectativa para que ele se tornasse um dos melhores do ano ficou quase certa. Porém, todo esse contexto envolto a obra não foi efetivada, fazendo com que a comparação inicial feita com o The Arrival venha a ser uma piada de mal gosto, já que a obra conseguiu se destruir em seu arco final, sendo uma das maiores decepções do ano pelo seu potencial desperdiçado.

Começando com seu roteiro. A proposta inicial de Kado era bem direta e até certo ponto simples: tentar retratar um mundo onde um ser desconhecido chega até a Terra buscando interagir com a sociedade, provendo principalmente conhecimento, visando ilustrar a relação de causa e efeito com base no nosso modelo sociopolítico atual. E nesse ponto a obra acerta em cheio, usando muito bem o contexto para explorar o impacto social dessa situação e fazendo questão de apontar alguns elementos que ficam claramente subentendidos como criticas severas a nossa forma de tratar de assuntos diplomáticos, explorando muito bem alguns conceitos mais densos, criando consecutivos “gatilhos” que trazem contexto e sustentam esses pontos. Ou seja, o roteiro é bem segmentado, a forma como é constituído esse processo deixa claro que a obra sabe dar base para seus diálogos e eles por sua vez são muito interessantes – já que o roteiro sabe intercalar entre o teor que a estória se desenvolve, controlando a “monotonia” dos episódios iniciais com boas quebras.

Essa ótima concepção de ideias e de desenvolvimento também se expandem no que tange ao elemento “sobrenatural”, usando uma base factível para sustentar os elementos que utilizava na obra, fazendo com que esses se tornem mais palpáveis ao espectador e recebam esses elementos com menos estranheza. É um “mindblow” muito bem embasado, e até mesmo nós últimos episódios isso se manteve, mas em um grau bem menor que anteriormente.


Agora vamos até o começo do fim, com a tragédia que começou no final do episódio 9, ponderando alguns pontos. Primeiramente, o problema geral do inicio da coisa toda não está em concepção, mas em execução. O que quero dizer com isso? Vamos pegar o primeiro erro grotesco: a ideia de que a Saraka veio do anisotrópico, que por sua vez não foi um erro em sua concepção, se fomos ver a construção do começo do episódio 10 fica bem claro que aquele recurso tinha um grande respaldo, tanto que se encaixou como uma luva com os demais conceitos apresentados até aquele momento, ou seja, o erro está claramente em como essa premissa seria executada. Toda a criação do contexto para passar essa informação e como ela seria utilizada que foi o problema, com uma sequência de “deus ex machina” sobre um elemento que havia sido bem concebido. Posteriormente, isso deixa de ser válido, já que os acontecimentos que são apresentados têm ambos os problemas, tanto de concepção, como de execução, fazendo com que tudo vire um completo “bullshit” pelas mudanças comportamentais dos personagens, onde o Shindo vira um protagonista de shounen genérico com aquelas frases efeito sem embasamento lógico e totalmente fora de contexto, enquanto o Zashunina que fica aparentemente louco, tenta matar todo mundo e vira o “vilãozinho” estereotipado. 

Tendo como único motivo para, de certa forma, embasar essa mudança, a sua experiência com as cópias do Shindo se mostrarem não condizente ao original, fazendo com que ele perceba o valor da vida naquele universo, o que ele mesmo chama de singularidade, dando algum respaldo para essa caracterização bem destoante do início e trabalhando melhor o Zashunina como um humano que agora tem seus próprios sentimentos em meio aos conflitos que o rodeiam. Ou seja, houve uma base descente, mas foi muito mal executada.

Finalizando, houve aquele episódio 12… Sério que transformaram Kado em battle shounen? Dá para apontar diversos elementos desse gênero e todos eles destoam do estilo de narrativa tratada em Kado, fazendo com que todo o “bullshit” conceitual seja intensificado por esses elementos que destroem completamente o que sobrou de seriedade na narrativa, sendo uma farofada completa, com mahou shoujo (Saraka), luta entre personagens alá Naruto x Sasuke no Naruto clássico, com o seu próprio vale do fim, um Shindo gritando o nome do Zashunina alá protagonista de battle shounen, além daquela linda frase de efeito de “você é meu amigo”, e por fim uma criança recurso de roteiro. Sério, é realmente incompreensível como o roteiro decaiu no final, parecem obras completamente diferentes, até a maturidade visual é diferente e quem fez o Storyboard do episódio 12 tem meu ódio até o final dos tempos, maldito fã de Naruto!

Quanto ao aspecto visual a obra foi bem, principalmente no que tange o CG,  que foi muito bem utilizado para agregar visualmente elementos “sobrenaturais” e “abstratos”, muitas das cenas eram compostas por uma sequencia visual de alto impacto justamente pelo bom uso dele, onde o CG contribuiu muito para agravar o senso de estranheza (no caso do Kado e os recursos do anisotrópico) e de expressionismo visual (alguns vislumbres, seja da história humana, ou do próprio anisotrópico). Porém, a obra peca quando tenta intercalar o 2D e o CG em algumas cenas, ficou recorrentes as vezes em que o personagem estava muito destacado do fundo, quebrando o senso de profundidade da cena, já que aquilo soa como sobreposição do personagem ao plano de fundo. Até ai estava tudo indo até que bem, mas nos episódios finais a animação tem uma mudança que deixou claro que não ia acabar bem. A paleta de cores, em muitas das cenas em que o Zachunina aparecia se utilizavam das mais escuras e pesadas, em contraste com as cores claras do começo do anime, nem a coloração do Kado escapou dessa, sendo claramente um recurso amador para tentar agravar visualmente o personagem como vilão da situação, dividindo o “bom” e o “mal” por palheta de cores. Além dos diversos bugs visuais que foram mais recorrentes nesse “arco final”.


Quanto a direção, dá pra resumir em duas realidades distintas: antes e depois do episódio 11. A direção de antes é muito madura e consistente, apresenta dinâmica visual clara e sequências visuais estupendas, usando muito bem os conceitos anisotrópicos para auxiliar o impacto visual que se destacava pela forma como corroborava-se com a trilha sonora e criando ambientes sensacionais e cheio de significado. Além disso, a forma como eram trabalhados os diálogos e a forma como o “jogo de câmeras” eram aplicados, favoreciam muito na quebra da monotonia em muitos momentos, fazendo fluir bem os diálogos mais pesados e densos sem precisar forçar demais, com tomadas aéreas realmente memoráveis. Mas, a direção do episódio 11 pra frente é completamente diferente, até mesmo um pouco antes já apresentava resquícios de problemas semelhantes, só que em um grau menor, com quebras bruscas demais, diálogos mal alocados, incoerência visual clara, contexto de battle shounen sem qualquer sentido,utilização de conceitos totalmente fora de contexto, etc. 

No quesito sonoplastia o anime até que se sai bem e isso se deve a forma como utilizam alguns sons que dão um ar de estranheza para os elementos do anisotrópico, destaque para o ambiente dentro do Kado, que só é imersivo daquela forma pelo ótimo trabalho de sonoplastia. Já a trilha sonora é muito boa, servindo bem como plano de fundo em momentos de diálogos e intercalando bem com o uso do silêncio nesses momentos, mas se destacando mesmo em momentos de mais ação (e não estou falando de lutas), mas nas tão comentadas sequências visuais que a obra faz uso. Nota também para a excelente música tema do anime, que se faz presente em diversos momentos e engrandece as cenas por meio de uma composição singular, que é facilmente vista como algo no mínimo icônico e agrega muito na identidade sonora da obra.

Conclusão

Portanto, já ficou mais que claro que Kado é uma obra com uma ótima produção até um certo ponto e que depois daquilo tudo vira “bullshit”, deixando a obra irreconhecível. Sendo realmente difícil recomendar a obra para alguém, porque ao mesmo tempo que a obra tem um começo e meio sensacionais, com uma das melhores sequências visuais que eu já em animes serializados, conceitos e desenvolvimento muito bem embasados e uma trilha sonora icônica, tudo é jogado no lixo devido aquele final e faz com que todos esses acertos pareçam irrelevantes perante ao nível dos erros. Se você quer dar uma chance pelos primeiros episódios tenha consciência que todos os acertos vão ser supridos por erros do mesmo nível posteriormente, ou seja, aproveite os acertos até que os erros cheguem, já que os picos são extremos, tanto para cima, como para baixo. E eu ainda estou tentando achar a dita “resposta correta” em meio a tantas erradas!

Direção: 7/10
Roteiro: 4/10
Produção Visual: 7/10
Soundtrack: 8/10
Entretenimento: 5/10

Nota Final: 6/10 (Decente)